segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Fabiano


Lembro bem como veio até mim rápido, intrometido. Lembro como não quis que viesse, alguns medos sem cara ou nome me circundavam, receios construídos em uma vida, vale largo. Mas ele, sem consciência disso transpôs com facilidade, com suas pernas tão mais curtas que as minhas, este intervalo de espaço e de tempo que havia entre nós. Por fim, cedi aos seus cheiros de menino bom. Fabiano, ponto de luz, veio chegando rápido em minha vida, como um vazamento luminoso por de trás do céu em penumbra, reminiscência brilhante que surge pequena e pontuda quando o mundo apaga.


 Gastava algumas horas da tarde sentada no banco do parque observava ,a espera de  colisões, as crianças brincando descontroladas por energia de quem cresce e quer. Elas iam desviando das quinas, sempre correndo, entre as construções velhas e precárias de ferro. Não havia muitas opções; dois balanços, um escorregador, um trepa-trepa, uma área de areia e um extenso gramado pisoteado, repleto de grama corrompida pelas centenas de pisadas leves. E iam infinitamente interagindo, se dividiam em filas contavam até dez e já era hora do próximo, e ai de quem não saísse em pulos pelo ar ao chegar berrado em coro o numero de ordem, o assento carcomido de tábua vermelha era almejado por todos, enquanto outras iam montadas em seus enormes cavalos transparentes esculpidos no ar pelos pequenos dedos, em galope se esquivavam com facilidade dos acidentes eminentes, emboscadas que havia a cada metro de terra. E foi lá que iniciou a minha crença em anjos, punhados deles, centenas a nos sobrevoar com suas asas coloridas,translucidas e diáfanas riscando o vento, todo o espaço.

 Aquele caos organizado dos parques de praças me detinha, os gritos delas criavam um emaranhado agudo e indecifrável que curiosamente me acomodava. Ele, Fabiano, me enredava mais que as outras. Menor que todos, bem pequeno, um dos dentes da frente da arcada era graciosamente estragado, seus olhos grandes, bem maior que toda a cara sempre brilhavam em contraste com os infinitos marrons da pele, areia em princípio de chuva, Fabiano era rajado!Vinha sempre correndo sem algum pudor pular no meu colo e, o susto que a sua velocidade sugeria, era amortecido e desfeito pelo impacto de nossos corpos, Fabiano tinha o peso dos pássaros.  

 Então conversávamos muito sobre qualquer coisa, pipas, doces, rinocerontes, pulgas. Tentávamos juntos desvendar o som das letras enquanto colecionávamos folhas caídas e vibrávamos com outras miudezas.A tarde era uma tarde ao lado de Fabiano.
Em jogos de adivinhas e outras brincadeiras encontrou o que de mim, e em mim, se escondia. Entre tantos tesouros desenterrados me ensinou um segredo valioso; certo fim de tarde me puxou ansioso e apontou o dedo mostrando no alto da arvore uma colmeia e entusiasmado disse saber bem que aquilo la no meio das folhas era um cacho de mel. (...)

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